29 de jan. de 2010

O neomoralismo do mercado (ou) Tiger Woods: nem tão vilão, nem tão herói assim

Embora seja muito crítica em relação a algumas opiniões da jornalista Barbara Gancia, o seu texto de hoje na Folha de São Paulo, intitulado "Tiger Woods é um crápula?" contribui para uma discussão necessária acerca do neomoralismo que parece dominar o mercado e a sociedade. Abaixo, a leitura do texto vale até o final, pelo desfecho da decisão do dono da Nike, Phil Knight em relação ao caso Woods.



BARBARA GANCIA

Tiger Woods é um crápula?

A nós, que não temos nada a ver com a história, caberia rir do ídolo esportivo que se deixou flagrar como um imbecil

COMO ANDO COM ideia fixa sobre o fenômeno da superexposição, serei forçada a testar sua paciência com minhas reflexões acerca do caso Tiger Woods. (...)
Advertência feita, vamos à vaca fria: Tiger Woods gosta de aproveitar as noites passadas longe de casa saindo com prostitutas. Descobrimos recentemente -com direito a ouvir na internet as gravações deixadas por ele na secretária eletrônica de uma recepcionista de Bel Air- que o melhor golfista do mundo não é aquele sujeito certinho que pensávamos que ele fosse. Não saberia citar estatísticas, mas desconfio que uma parcela significativa dos homens que conheço, ecologistas incluídos, sairia com um sem número de dançarinas se lhes fosse dada a oportunidade.
Já deu para notar que o advento do YouTube e de sites de fuxico tornou a vida dos voyeurs (ou seja, a nossa) muito mais interessante e que é apenas uma questão de tempo antes que todo mundo, do George Clooney ao cardeal arcebispo de Rangun, seja flagrado fazendo alguma coisa errada. Foi a vez do Tiger Woods; e a questão do seu adultério, que deveria ser resolvida entre ele, sua mulher e as agências de publicidade que venderam seu nome como garoto-propaganda, virou munição para a neocarolice da impostura.
A nós, público que não tem nada a ver com a história, caberia rir do fato de que o ídolo esportivo se deixou flagrar como um imbecil. Mas, não. Estes são os tempos da tirania da saúde e da higienização, esta é a época em que bastou chamar preto de negro para acreditar que o preconceito foi varrido do mapa. E assim nós nos achamos no direito de julgar Tiger, esquecendo do corno que metemos na cara-metade naquela festinha da firma ou na vez que ficamos de porre ou fumamos um baseado na frente da prole.
Tiger Woods é um überatleta. E sua habilidade nos campos de golfe pode ajudar a vender espuma de barbear, isotônico e sucrilhos. Mas isso não faz dele automaticamente um "exemplo para a juventude". Quem diz que faz é o mercado, não é mesmo? E você vai se deixar tutelar por esse "bully" dos infernos? Se a perseguição fosse apenas "Schaudenfreude", o ato de derivar prazer do sofrimento alheio, ainda vá lá. Recalque é um sentimento humano dos mais banais. Mas essa crítica que atribui superioridade moral a quem acusa já está começando a passar dos limites.
O presidente e fundador da Nike, Phil Knight, deu uma resposta corajosa à onda de hipocrisia. Ele se recusou a romper contrato com Kobe Bryant, no episódio em que o jogador da NBA foi acusado de estupro e admitiu adultério. Depois, fez vistas grossas quando Ronaldo foi pego com travestis. E, agora, reafirmou a parceria com Tiger. Segundo Knight, Woods sofreu ataques desproporcionais pelo que fez e tem "direito à privacidade". Estou quase jogando todos os meus tênis Puma e Adidas no lixo!

3 comentários:

Reginaldo Nepomuceno disse...

A defesa dela foi brilhante, mas nestes tempos de reverse panoptic já não importa mais quem é a bola da vez, e sim o bafafá causado. Ponto pra Nike, que entre passar um pano e posar de moralista acabou se isentando do dever de punir seu atleta, beneficiando o esporte (leia-se: seus lucros)

Murilo disse...

Woods é só ocaso da vez. Em breve será algum outro. As notícias se dividem de forma simples. Tragédias para manter o nível de solidariedade dos espectadores, violência para dar medo aos pontos de audiência, escândalos para não deixar celebridades ou políticos com uma taxa de boa popularidade por muito tempo (ninguém pode ser maior que a mídia. MJ.) e matérias bobas e otimistas para balancear as outras. O tempo de vida de cada furo midiático é muito curto, muito mesmo. Por isso de vez em quando, na falta de algum outro entretenimento, é preciso apelar para a super cobertura de casos de meninas Eloás.

Woods provavelmente será lembrado como um fantástico atleta e só. Isso se não voltar ao esporte em alguns poucos meses. Nike sabe disso muito bem, sempre soube.

Claudio Eduardo disse...

Moralismo pouco é bobagem!

“São tudo pequenas coisas e tudo deve passar”, já dizia certa Legião. Aprendi que a ética serve, entre outras coisas, para impedir que a moral se torne moralismo, ou seja, que estamos sujeitos às alterações e que estas devem ser compreendidas como formas de evoluirmos, na medida do possível, claro.

A propaganda precisa enxergar que não é detentora das almas das pessoas que são expostas em suas vitrines. Assim como também o mercado e seu “pensar” empresarial deveriam cuidar para não caírem no ostracismo de tornar “vilões” aqueles que pouco antes foram erguidos como “heróis” pelos mesmos. Talvez Tiger Woods gostasse de p@#$ antes mesmos de pensar em Golf. E aê? Isso faz dele melhor ou pior naquilo que ele e seus logotipos estampados no peito afirmam ser? (isso não é uma defesa, é uma pergunta apenas).

É um perigo eleger alguém como exemplo. Sempre será um risco associar uma instituição ou uma marca a pessoas e também o contrário. Pessoas não são confiáveis. Elas formam um bando de variáveis incontroláveis. Talvez por isso, deveriam ser mais respeitadas e melhor compreendidas e, quem sabe, poderíamos nos iludir menos e aproveitar melhor nosso tempo de vida. Isso seria realidade, não fosse os interesses de alguns “vilões” que nesse post passam por “mocinhos”, como bem disse Régis em seu comentário.

É isso. Ou não...

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